segunda-feira, 26 de abril de 2010

O PROFETA BRASILEIRO

Em meados do século 19, o mundo se encantou com Júlio Verne e um tipo de literatura até então desconhecida: a ficção cientifica. Mas logo o encanto se tornou um assombro: muitas coisas que ele escreveu de fato aconteceram. Verne previu, entre outros inúmeros inventos, a televisão; o helicóptero; o cinema falado; a iluminação a néon; o ar condicionado; os arranha-céus; os mísseis teleguiados; os tanques de guerra; os veículos anfíbios; o avião; a caça submarina; o aproveitamento da luz e da água do mar para gerar energia; o uso de gases como armas químicas. Além de descrever com detalhes impressionantes essas invenções, suas obras falavam de um futuro cheio de novas tecnologias que ajudariam o homem em sua busca da felicidade. Já H. G. Wells, que surgiu no mundo literário uns cinqüenta anos depois, preferia falar em como a tecnologia poderia ser usada como uma força negativa para a humanidade. Mas existiu um escritor brasileiro que conseguiu juntar as duas opiniões em uma obra genial.
Descobri essa perola semana passada, no dia 18, quando o Brasil “comemorou” o Dia do Livro Infantil. Essa data foi escolhida por causa do nascimento do maior nome da literatura infantil brasileira: Monteiro Lobato. Bisbilhotando algumas de suas obras, descobri que Monteiro Lobato também havia escrito livros para o publico adulto.
Mas, antes de falar do milagre, falemos do santo. Nascido no dia 18 de abril de 1882, em Taubaté, cidade de São Paulo, Juca, como era chamado, brincava com suas irmãs menores Ester e Judite. Naquele tempo não havia tantos brinquedos, eram toscos, feitos de sabugo de milho, chuchus, mamão verde, etc... Adorava os livros de seu avô materno, o Visconde de Tremembé. (e aí estão suas inspirações). Sua mãe o alfabetizou, teve depois um professor particular e aos 7 anos entrou num Colégio. Leu tudo o que havia para crianças em língua portuguesa. Aos 18 anos entra para a Faculdade de Direito por imposição do avô, pois seu negócio sempre foi desenhar e preferia a Escola de Belas-Artes. Em 1911 morre seu avô, o Visconde de Tremembé, e dele herdou a fazenda Buquira. Logo, o então promotor de Areias passa a fazendeiro. No entanto, a geada, as dificuldades, levam-no a vender a fazenda em 1917 e a transferir-se para São Paulo. Mas na fazenda escreveu o JECA TATU, símbolo nacional. Em 1921 dedicou-se à literatura infantil, lançando entre seus muitos sucessos o Sítio do Picapau Amarelo e seus célebres personagens. Uma curiosidade é que através dos personagens do Sítio, Monteiro Lobato revela pedacinhos de sua personalidade. Através de Emília diz tudo o que pensa; na figura do Visconde de Sabugosa critica o sábio que só acredita nos livros já escritos; Dona Benta é o personagem adulto que aceita a imaginação criadora das crianças, admitindo as novidades que vão modificando o mundo; Tia Nastácia é o adulto sem cultura, que vê no que é desconhecido o mal, o pecado. Narizinho e Pedrinho são as crianças de ontem, hoje e amanhã, abertas a tudo, querendo ser felizes, confrontando suas experiências com o que os mais velhos dizem, mas sempre acreditando no futuro. E assim o Pó de Pirlimpimpim continuará a transportar crianças do mundo inteiro ao Sítio do Picapau Amarelo, onde não há horizontes limitados por muros de concreto e de idéias tacanhas.
Tudo muito bom, mas cadê a tal da ficção cientifica? Bem, a verdade é que ela não fez tanto sucesso. Até hoje tem muita gente fazendo duras críticas. Mas não se pode negar que foi um marco na literatura brasileira: a primeira ficção cientifica escrita por aqui.
Em 1926, Monteiro Lobato lançou O Presidente Negro (originalmente com o nome de O Choque das Raças). Na história, o atrapalhado Ayrton Lobo conhece acidentalmente o professor Benson, um cientista que conseguiu inventar um aparelho que permitia ver o futuro. Quer saber o que vai acontecer nos próximos séculos? O livro aborda praticamente três aspectos.
Tecnologia. Monteiro Lobato fala bastante em como a internet mudará a vida das pessoas. Em um mundo conectado, o trabalho poderá ser feito em casa. Assim, não existirá mais a correria de hoje em dia.
Comportamento. Essa é uma área bastante cômica. Entre as mudanças, haverá as mudanças conjugais, que reduzirá o número de divórcios e dará aos casais uma lua de mel anual.
Política. O livro se centraliza nessa área. Entre algumas coisas surpreendentes, ele fala da unificação da América do sul e sua divisão em dois blocos. Alguns países como Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil se unem por motivos econômicos. Mas logo se dividem pelo mesmo motivo. Assim, no sul do continente nasce uma nova potencia: a República do Paraná. Mas a história se centraliza na política americana, num momento em que as divisões raciais podem fazer a potencia se desmoronar.
Inegavelmente, o livro tem algumas idéias prevalecentes na época em que foi escrito. Aí está o motivo de tantas criticas. Mas não podemos esquecer que, apesar de ser um grande pensador, Monteiro Lobato ainda estava preso a algumas idéias de sua época. Ainda assim, é um livro fascinante, que não nos deixa parar de ler até conhecer o incrível desfecho da história.

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